Noajali, Bangladesh, 30/3/2012 – Bangladesh, país que foi sinônimo de miséria, reduziu a pobreza pela metade em menos de duas décadas, segundo dados oficiais. E as mulheres tiveram um papel protagonista nesse avanço. O estúdio de cerâmica de Kalpana Rani Pal na capital é humilde de todos os pontos de vista, mas pequenas empresas como esta são as que colaboraram para a redução da pobreza. “Ganho seis mil takas (US$ 72) por mês vendendo louça de barro”, contou Kalpana, de 34 anos, feliz por ter feito um curso gratuito de cerâmica de três meses, dado pela não governamental Sociedade de Desenvolvimento Rural de Noajali (NRDS).
Jhumur Majumder, de 37 anos, também aproveitou um curso de cerâmica dentro de um projeto de desenvolvimento para artesãos, organizado pela NRDS há cinco anos. Ela se lembra da miséria que sofriam as famílias como a sua. “Não imagino o que seria de nós se não fosse o estúdio”, afirmou.
“O projeto é uma iniciativa para desenvolver as habilidades das mulheres pobres que têm potencial para assumir um negócio”, explicou à IPS o coordenador do programa da NRDS, Mohammad Kaiser Alam. Foi chave as mulheres terem se organizado em um “samiti” (grupo feminino) na aldeia de Dewanjee Bari, em Noajali, 320 quilômetros a sudeste da capital de Bangladesh.
Jhumur, que recebeu um pedido de Daca para fabricar 200 peças, disse que o trabalho lhe renderá cerca de US$ 120 líquidos. “Houve um tempo em que não havia oportunidades de trabalho aqui. Graças ao programa de capacitação gratuito da NRDS estamos de pé”, disse Minati Rani Sutra, de 34 anos, responsável por um samiti e em busca de mão de obra para fazer frente aos pedidos de louça de qualidade.
Cerca de 30 mil mulheres de 1.200 samitis se beneficiaram dos programas de capacitação proporcionados por essa organização neste distrito. Atualmente, a NRDS faz uma seleção de pessoas para outros cursos dentro de um programa de geração de emprego. A organização também ajuda na venda de roupa de algodão, tapetes de juta e produtos de qualidade feitos com bambu e terracota pelos samitis.
O informe sobre o avanço de Bangladesh em relação aos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio elogia este país por reduzir a pobreza quase pela metade em menos de duas décadas. O documento foi divulgado pela Comissão de Planejamento de Bangladesh no dia 22.
Os ODM foram acordados na Cúpula do Milênio da ONU, em 2000, quando 180 governantes adotaram oito grandes objetivos de desenvolvimento. As metas visam a reduzir pela metade a proporção da população em situação de indigência e fome, conseguir educação primária universal, promover a igualdade de gênero, reduzir a mortalidade infantil em dois terços e a materna em três quartos, frear a expansão do vírus HIV, causador da aids, da malária e de outras doenças, assegurar a sustentabilidade ambiental e gerar uma sociedade global para o desenvolvimento entre Norte e Sul, tudo até 2015.
“O crescimento econômico conseguiu uma impressionante redução da pobreza, de 56,6%, em 1992, para 31,5%, em 2010. A redução sofreu aceleração na atual década em relação à anterior”, diz o informe, acrescentando que, “se mantendo a tendência, Bangladesh poderá alcançar a primeira meta bem antes de 2015”.
Debapriyo Bhattacharya, um dos economistas mais conhecidos e diretor-executivo do Centro para o Diálogo Político, disse à IPS que o trabalho das organizações não governamentais é o principal responsável por este avanço. “Inclusive com a incapacidade do Estado em oferecer assistência social e o fracasso do mercado para gerar oportunidades de emprego, as ONGs em suas múltiplas intervenções contribuíram definitivamente para reduzir a pobreza. Foi um esforço sustentado que agora ganha maior força”, destacou.
Qazi Joliquzzaman Ahmad, presidente da Fundação Palli Karma Shahayak, estima que o que fez a diferença foi a ênfase nas mulheres. A agência colabora economicamente com as ONGs em programas de alívio da pobreza. “A capacitação das mulheres definitivamente contribuiu para a redução da pobreza. É significante a quantidade que trabalha em médias e grandes empresas e também contribuem na geração de emprego”, detalhou. Antes, as mulheres recorriam ao microcrédito para pequenas empresas. Mas agora muitas deles pedem empréstimos em nível macro. Esta é uma forma de reduzir a pobreza”, ressaltou.
O governo deixou, em grande parte, o combate da pobreza nas mãos da sociedade civil, mas o compromisso político foi importante nos avanços para o cumprimento dos ODM, ponoderou Ahmad. A evidência se observa principalmente naquelas aldeias onde há décadas as ONGs mobilizam recursos de uma forma que o governo sozinho não poderia fazer.
“Não foi fácil romper o ciclo da pobreza”, insistiu Jalaluddin Ahmed, diretor da Trinamool, uma ONG que trabalha no distrito de Rajshahi, assolado pela indigência. “Houve um tempo em que as mulheres não podiam trabalhar. A saída de casa estava limitada sob as rígidas normas da purdah (proibições religiosas para a população feminina). As famílias pobres dependiam apenas da renda dos homens”, explicou.
“As limitantes sociais e religiosas desapareceram quando as ONGs assumiram sua defesa e apareceram os programas de microcréditos. Quando os homens se deram conta de que as mulheres eram igualmente capazes de contribuir para a renda familiar, começaram a permitir que saíssem para trabalhar”, contou Ahmed.
“Atualmente, elas decidem como ganhar dinheiro e mandar os filhos à escola”, disse Abdul Awal, diretor-executivo da NRDS. “Não se trata apenas de empréstimos, mas do desenvolvimento de capacidades, de promoção, de discussões entre as integrantes do samiti e, o mais importante, de um enfoque a partir das bases”, ressaltou.
Bangladesh ainda faz parte do grupo de países menos adiantados da Organização das Nações Unidas por seus baixos indicadores em matéria de desenvolvimento socioeconômico, mas a pobreza diminuiu de forma drástica: de 74% em 1974 passou para 56,6% em 1992, depois para 49% em 2000 e, finalmente, para 31,5% em 2010. Envolverde/IPS