Divulgado na última semana, o relatório Unidos da Ciência 2024, que reúne agências das Nações Unidas, organizações meteorológicas e instituições científicas, alerta para o risco de aumento das temperaturas até o fim do século. A previsão é de que os índices subam 3°C, o dobro do estabelecido no Acordo de Paris, assinado em 2015, quando foi definido que +1,5ºC é número ideal para assegurar os efeitos negativos das crises climáticas.
As consequências do aquecimento global já começam a se manifestar. Os últimos acontecimentos, como as vastas queimadas ocorridas no Brasil, demonstram a gravidade do problema, que impacta a saúde de todo o coletivo, incluindo as diversas espécies animais, muito responsáveis pelo bem-estar do ecossistema e preservação da biodiversidade, como é o caso das abelhas.
Para trazer luz sobre a relação entre as mudanças climáticas e a polinização, principal atividade das abelhas, Baldoni apresenta as orientações do engenheiro de alimentos, presidente da A.B.E.L.H.A (Associação Brasileira de Estudos das Abelhas) e CEO da Baldoni, Daniel Cavalcante.
Polinização: um processo vital para a vida
“A capacidade das abelhas de captar os aromas das flores é um fator crucial para a polinização, um processo essencial tanto para a manutenção da vida no planeta, quanto para a produção agrícola. No entanto, ondas de calor, como as que atingiram o Brasil recentemente, podem prejudicar essa habilidade essencial, afetando a capacidade olfativa e o trabalho de reprodução desses insetos”, destaca Cavalcante.
“O CEO explica que no ciclo da polinização, a natureza trabalha em conjunto – “assim, o aroma das flores é um dos principais mecanismos responsáveis pelas plantas para atrair polinizadores. As antenas das abelhas, por sua vez, captam as moléculas aromáticas e enviam sinais elétricos ao cérebro do inseto, que o ajudam a identificar as flores certas para visitar. Durante a noite, quando a visibilidade é reduzida, o cheiro das flores se torna ainda mais importante. Todo esse processo acontece em sinergia e o resultado gera a produção dos alimentos que chegam as nossas mesas”, esclarece.
Para se ter ideia, no Brasil, segundo o 1º Relatório Temático sobre Polinização, Polinizadores e Produção de Alimento (2019), de 191 espécies de plantas relacionadas à alimentação, 91 dependem de polinizadores. “As abelhas muitas vezes são associadas somente à produção de mel, entretanto, elas estão entre os agentes mais importantes para a biodiversidade e a vida no planeta. Sem elas, alguns alimentos importantes para uma dieta saudável e equilibrada, como frutas, legumes e verduras, podem ter sua produção inviabilizada. A importância é tanta que, segundo a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), em torno de 70% dos vegetais consumidos pelos humanos e outros animais herbívoros dependem da polinização para se tornarem viáveis. Para manter o equilíbrio ambiental, a apicultura torna-se uma maneira relevante de combater a atenuação do animal, que possui mais de 20 mil espécies em todo o mundo, sendo 3 mil delas apenas no Brasil”, complementa.
Efeito cascata
Estudos científicos mostram ainda que gases poluentes, como ozônio e óxidos de nitrogênio, degradam os aromas florais, essenciais para que os insetos localizem as plantas. A influência é significativa, com uma queda de até 70% na visitação de insetos em plantas expostas à poluição, o que prejudica a produção e qualidade do néctar e pólen das plantas.
“Com a perda da capacidade olfativa das abelhas, provocadas pelas ondas de calor e pela poluição ambiental, o prejuízo é coletivo, não só pelos aspectos econômicos, mas pela perda da biodiversidade. O que temos observado é um efeito cascata na reprodução vegetal e na sobrevivência dos polinizadores, contribuindo para o declínio das populações de insetos, já pressionadas por outros fatores como o uso indiscriminado de defensivos e perda de habitat pelo desmatamento e queimadas ilegais”, alerta. “Mais do que nunca é essencial repensar sobre o impacto da ação humana sobre a vida no planeta. As mudanças climáticas representam um risco real para as populações de abelhas, que podem ser drasticamente reduzidas. Por outro lado, a apicultura, que consiste na criação de abelhas para extração de mel e outros produtos da colmeia, quando praticada de uma maneira responsável do ponto de vista ambiental, pode ser uma forma de ajudar a reverter esse cenário”, conclui o executivo.