Gilberto Gil é um entusiasta confesso da ciência. A física quântica, por exemplo, foi inspiração de seu álbum “Quanta”, de 1997. Nele, Gil trata de ciência e arte, “pontes entre o campo mágico e o campo da física”, segundo ele mesmo em entrevista*.
Provavelmente inspirado pelo pensamento científico, o imortal já declarou que no período turbulento que vivemos, as coisas estão “melhor e pior”. Tal raciocínio cai bem a dois fatos relacionados ao clima: a reeleição de Donald Trump como presidente dos EUA e a diminuição do desmatamento da Amazônia e da emissão de carbono no Brasil.
Durante sua campanha, Trump rejeitou políticas ambientalistas, apoiou a retomada da produção ilimitada de combustíveis fósseis e prometeu retirar seu país do Acordo de Paris. Afirmou que iria “liberar o poder das empresas americanas”, mantendo “os mais altos padrões ambientais”. Provavelmente, irá desregularizar a política ambiental estadunidense e cortará investimentos do país no combate às mudanças climáticas.
Lee Zeldin, seu nomeado para administração da Agência de Proteção Ambiental dos Estados Unidos (EPA), anunciou no X que pretende restaurar o domínio energético dos EUA e revitalizar a indústria automobilística. “Faremos isso enquanto protegemos o acesso ao ar e à água limpos”, prometeu o político, que tem histórico crítico à regulamentação ambiental.
Já no Brasil, o desmatamento na Amazônia caiu 45,7% entre agosto de 2023 e julho de 2024, maior queda proporcional já registrada pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). No Cerrado, a diminuição foi de 25,7% no mesmo período. Nos 70 municípios prioritários para combate ao desmatamento, houve uma redução de 53%. Na Bahia, a queda chegou a 63,3%.
Em período semelhante, o Sistema de Estimativas de Emissões de Gases de Efeito Estufa (SEEG) registrou uma queda de 12% nas emissões de gases de efeito estufa. É a maior redução anual em 15 anos, segundo o Observatório do Clima. Esses resultados são atribuídos à retomada do Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia Legal.
Por isso, quando houver dúvida ou desesperança na luta pelo clima, faz sentido relativizar tanto as notícias ruins quanto as boas. Afinal, a ação climática é a somatória de derrotas e vitórias, sejam maiúsculas ou minúsculas. Ou como resume o mestre em “Quanta”**Do “cântico dos cânticos” ao “quântico dos quânticos”.
*RYFF, Luiz Antônio. Cantor lança “Quanta”,sua leitura poética sobre ciências e sobre interfaces da ciência com filosofia, religião e arte’. Folha de S.Paulo, São Paulo, 9 abr. 1997.
** GIL, Gilberto. Quanta (part. Milton Nascimento). In: GIL, Gilberto. Quanta. WEA, 1997. Acesso em: 13 nov. 2024. Disponível em: Spotify.
Doutor em Ciências pelo PROLAM-USP, Mestre e jornalista pela PUC-SP. Trabalhou na TV Cultura de São Paulo e na agência de notícias EFE, em São Paulo e em Madri. Organizador e autor de livros e artigos científicos sobre comunicação e jornalismo. Pesquisador sobre como jovens se envolvem com notícias climáticas. Atual professor da ESPM-SP, onde ministra a disciplina “Jornalismo e as Mudanças Climáticas”.