Quem venceu a grande discussão econômica dos anos 1990?
Numa ponta, os seguidores do chamado “consenso de Washington” – que dizia que bastaria a um país equilibrar suas contas fiscais (ainda que ao custo de destruir sua infraestrutura e suas políticas sociais), não se importar com os juros e dar plena liberdade aos fluxos de capitais para o desenvolvimento se impor por si só.
Na outra ponta, os críticos que mostravam que capitais especulativos não pavimentam o desenvolvimento a longo prazo. Pelo contrário, sua volatilidade e seus impactos sobre o câmbio impedem a consolidação da economia.
No Valor Econômico de quinta-feira, 21, o correspondente do jornal em Washington, Alex Ribeiro, escreve sobre o livro recém-lançado Quem Precisa Abrir a Conta de Capitais, de John Williamson, o pai do “consenso”, junto com Olivier Jeanne e Arvind Subramanian.
A principal conclusão do livro é a de que “a livre mobilidade de capitais parece gerar poucos benefícios em termos de crescimento de longo prazo. (…) Pelo contrário, a literatura econômica mostra que controles de capitais são bons para evitar crises provocadas por fuga repentina de capitais voláteis”.
Subjacentemente, defende a posição de economistas do FMI, do G-7 e do G-20, de definir normas de conduta para os diversos países, sobre como utilizar ferramentas de controle de capitais.
Esse tipo de posição tem sido criticada pelo representante brasileiro no FMI, Paulo Nogueira Batista Jr.
Mas há uma justificativa para essas “recomendações” – e ela é extraordinariamente vexatória para o Brasil. Sem um nihil obstat do establishment internacional, autoridades econômicas brasileiras não têm coragem de enfrentar o estabelecido, mesmo que o estabelecido seja um conjunto de práticas irracionais.
Essa subordinação ao pensamento financeiro internacional – quando ele defendia o livre fluxo de capitais – gerou duas tragédias brasileiras, que mataram 20 anos de industrialização no país: o período Pedro Malan (1994-1999) e o período Antonio Palocci (2005-2009).
Depois, condicionou de forma aguda o pouco corajoso ministro da Fazenda, Guido Mantega.
Subramanian aponta a enorme timidez de Mantega, quando decidiu implantar um IOF (Imposto sobre Operações Financeiras) de apenas 2% sobre ingresso de capitais para aplicação em renda fixa.
A alíquota era ridícula.
O que ele não sabe é que a medida, mesmo ínfima, suscitou um alarido infernal dos meios de comunicação, alimentado pela tropa de choque da Selic – Mailsons, Gustavos e Mirians –, acenando com o fim do mundo, com a volta da inflação e com o fim dos investimentos.
Quando se completa o ciclo, percebe-se que as análises dos chamados “mercadistas” estavam erradas; os alertas dos críticos estavam corretos. Câmbio fora do lugar, taxa Selic de dois dígitos, superávit à base de contingenciamento orçamentário, tudo isso, hoje em dia, despertaria ironias em qualquer economista de calibre internacional.
Mas foram os mercadistas que venceram o jogo. Porque o objetivo final não era o desenvolvimento do país, mas a consolidação dos novos grupos financeiros. E conseguiram isso sustentando falsas ideias por quase duas décadas.
* Luis Nassif é jornalista econômico e editor do site www.advivo.com.br/luisnassif – [email protected].
** Publicado originalmente no site Carta Capital.