Proteger as crianças da publicidade excessiva, não incentivar o consumismo, estimular a imaginação e a criatividade delas, promover o contato com a natureza e com os livros. Seguramente, é um caminho promissor se desejarmos adultos responsáveis, mais sensíveis e solidários, e, sobretudo, mais motivados a agirem como agentes transformadores da realidade. É muito comum quando falamos em meio ambiente e sustentabilidade, indagarmos sobre que Planeta e qualidade de vida estamos legando às gerações futuras, mas nos esquecemos de perguntar que crianças estamos legando ao Planeta.
Em Outubro, o Ministério do Meio Ambiente (MMA) lançou o Caderno de Consumo Sustentável “Consumismo infantil: na contramão da sustentabilidade”, em parceria com o Instituto Alana, organização não-governamental de defesa da infância livre de consumismo, dando início à campanha Criança e Consumo Sustentável, que deverá ocorrer ao longo de 2013.
No dia 15 de Outubro, comemorou-se o Dia do Consumo Consciente. A data foi instituída pelo Consumers International e adotada pelo Ministério do Meio Ambiente desde 2009 para conscientizar a população sobre os problemas socioambientais que os padrões atuais de produção e consumo estão causando. As montanhas de lixo que se acumulam nos lixões e aterros sanitários são apenas um sintoma de algo mais grave, a doença urbana do consumo concentrado e exacerbado de embalagens e o do descarte inadequado.
A Política Nacional de Resíduos Sólidos, aprovada em 2010, e o Plano Nacional dela derivado são regidos pelo princípio do compartilhamento. Não basta o Governo fazer sua parte, nem mesmo as empresas – que deverão responsabilizar-se pelo destino final das embalagens que produzem ou distribuem – se os consumidores não mudarem hábitos de consumo e de descarte.
Para dar um exemplo, o MMA assinou um acordo com a Associação Brasileira de Embalagens para que as embalagens de todos os produtos passem a informar como deve ser feito o descarte após o uso dos produtos (no pós-consumo). As adequações serão feitas em mil produtos por ano, até que todas as embalagens tragam essa informação em 2014.
Mas não basta descartar adequadamente, é necessário reduzir o volume de embalagens. É notório e sabido que não existem nas cidades, sobretudo as maiores, terrenos disponíveis para a construção de aterros sanitários. Nenhum bairro quer a proximidade com “lixões” ou seus sucedâneos.
Pesquisas recentes mostram a crescente pressão da propaganda televisiva sobre as crianças. No mês de Outubro, vésperas ao “dia” das crianças, cerca de 64% de todos os anúncios são dirigidos às próprias crianças que não têm como discernir ou se proteger desse bombardeamento. O comércio vem antecipando o Natal e já em Outubro há enfeites natalinos e ofertas de presentes. Os estudos sobre o consumo de classe média mostra como é crescente o endividamento das famílias para satisfazer expectativas de consumo dos filhos. Muitos dos brinquedos usam pilhas e baterias, que contém materiais perigosos, e grande parte deles não traz à criança nenhum desafio à imaginação ou criatividade. Daí o fato de a maior parte delas “enjoar” do brinquedo rapidamente e projetar o desejo em ter outras novidades.
Cabe aos pais, professores e cuidadores das creches mediar essa relação da criança com o consumo: por que substituir a banana ou a maçã na merenda do seu filho por um produto industrializado? Quais a desvantagens nutricionais envolvidas? O crescimento da Classe C tem levado a população a oferecer às crianças mais salgadinhos, biscoitos e refrigerantes sem fazer a conta desse custo lá na frente.
Atualmente, duas campanhas conscientizam a população sobre a importância de separar o lixo seco do molhado. Os filmes publicitários da campanha “Separe o lixo, acerte na lata” mostram como uma garrafa pet pode virar tecido, telha ou móvel; e como caixas de leite e latinhas de alumínio podem ser transformadas em outros objetos úteis e bonitos. Já a campanha “Saco é um saco” incentiva os consumidores a deixarem de lado as sacolinhas plásticas descartáveis e usarem sacolas duráveis ou caixas para carregar as compras e armazenar o lixo.
Cada vez mais as pessoas compreendem que a luta pelo meio ambiente não é uma batalha para “salvar o Planeta”, mas sim para preservar a nós mesmos e o ambiente em que vivemos. Segundo pesquisa “O que o brasileiro pensa do meio ambiente do consumo sustentável”, realizada este ano pelo Ministério do Meio Ambiente, às vésperas da RIO+20, 65% dos brasileiros consideram que cuidar do meio ambiente tem a ver com a nossa sobrevivência.
Quase tudo o que, nós adultos, buscamos fazer, como reduzir o desmatamento da Amazônia para garantir o equilíbrio climático no Planeta; reduzir o consumo de sacolas plásticas para diminuir a geração de resíduos e evitar enchentes; separar o lixo para reciclagem; preservar a biodiversidade; gerar energia de fontes renováveis; são ações têm nossos filhos como motivação. Afeto e responsabilidade se misturam na visão que cada geração tem de “melhorar o mundo”.
Mudar a cabeça de adultos de gerações distintas é um trabalho difícil. Muitos cresceram acreditando na abundância da natureza, outros na importância de sobrepujá-la, e a grande maioria sequer relaciona seu consumo com qualquer impacto ambiental. São os jovens e as crianças que melhor assimilam a mensagem de defesa do meio ambiente e de mudança dos padrões de vida e consumo. É importante fortalecer esse aprendizado, estimulando cada vez mais o pensamento crítico nas crianças, vinculando sua ideia de qualidade de vida com o meio ambiente.
Usufruir sustentavelmente dos recursos ambientais; consumir sem consumismo; compreender que é mais importante “ser” do que “ter”; respeitar o próximo e cuidar do que é de todos – esses são valores essenciais para um cidadão brasileiro contemporâneo.
* Samyra Crespo é doutora em História da Educação Brasileira pela Universidade de São Paulo, Secretária de Articulação Institucional e Cidadania Ambiental do Ministério do Meio Ambiente.
** Publicado originalmente no site Eco21.