Em São Paulo há duas cordilheiras de lixo. São os aterros sanitários Bandeirantes (que funcionou entre 1979 e 2006) e São João (entre 1992 e 2007). Juntos, eles pesam tanto quanto 80 milhões de fuscas, ocupam a área de 270 estádios do Maracanã e chegam à altura de um prédio de 50 andares.
Essa lixarada, além de ocupar espaço da cidade e contaminar o solo, ainda emitia uma quantidade astronômica de metano, produzido pelas bactérias anaeróbicas que consomem o lixo nas camadas subterrâneas onde não há oxigênio. Como o metano contribui 21 vezes mais com o efeito estufa do que o CO2, os aterros eram a segunda principal causa de emissão de gases de efeito estufa, depois da energia (tanto a rede elétrica quanto a que move os carros). Quase 25% do total de emissões paulistanas vinham dos aterros. Vinham. Não mais.
Entre 2004 e 2008, a Prefeitura cedeu os aterros para que as empresas responsáveis por eles – a Loga, que cuida do Bandeirantes e a EcoUrbis, que cuida do São João – criassem, em parceria com a Biogás, usinas termelétricas que captam o metano liberado e o queimam, gerando energia elétrica.
A energia elétrica gerada pelas usinas nos dois aterros é capaz de alimentar 800.000 pessoas, apenas 7,5 % da população de São Paulo, mas reduziu em mais de 20% as emissões de gases de efeito estufa na cidade – quase a totalidade das emissões dos aterros.
A criação das usinas fez com que os aterros pudessem vender créditos de carbono em troca da redução da emissão de gases de efeito estufa. Funciona assim: os países e empresas que não conseguiram atingir as metas de redução de emissões de gases do efeito estufa estabelecidas no Protocolo de Kyoto compram créditos de quem reduziu.
Os créditos do Aterro Bandeirantes foram leiloados por R$ 140 milhões, divididos meio a meio entre as empresas responsáveis e a Prefeitura. Os R$ 70 milhões da Prefeitura são dinheiro limpo que a cidade arrecadou a partir de algo que antes não tinha valor nenhum. O dinheiro é administrado por um fundo da Secretaria do Verde e do Meio Ambiente que financia projetos ambientais em áreas próximas aos aterros.
Para a Prefeitura, foi ótimo negócio. “Não gastamos um centavo: foram as empresas que construíram as usinas, em troca do direito de explorá-las”, diz Eduardo Jorge, secretário do Verde e do Meio Ambiente da cidade. Dinheiro grátis, com o bônus de reduzir a emissão de gases.
Usinas de metano são uma opção viável e rentável para qualquer cidade com mais de 500.000 habitantes que descartem seu lixo em aterros sanitários. Cidades com população inferior podem se juntar em consórcios com outras para conseguir viabilizar a operação. “Claro que o ideal é produzir menos lixo, mas ter usinas de metano é um belo jeito de mitigar o impacto”, diz Eduardo Jorge. O potencial é gigante. Segundo o Plano Decenal de Produção de Energia 2008/2017, se todos os municípios brasileiros seguissem esse caminho, 15% da energia brasileira poderia ser suprida pela queima do gás do lixo.
*Publicado originalmente no site !sso não é Normal.