Arquivo

Bateria suíça pode descarregar

O Lago de Gries, na Passagem de Nufrenen, Suíça. Foto: Ray Smith/IPS

 

Meiringen, Suíça, 12/12/2012 – As empresas suíças de energia se mostram determinadas a converter o país em uma “bateria para a Europa”. São realizados vultosos investimentos em um projeto hidrelétrico de grande escala, mas não é uma certeza que isto será rentável. Com a decisão de acabar com a energia nuclear, na Suíça e na Alemanha o olhar se volta para as fontes renováveis.

Na Alemanha há um enorme impulso para a produção de energia solar e eólica, enquanto as empresas energéticas suíças buscam aumentar sua capacidade de armazenamento na Cordilheira dos Alpes. Cerca de 11% da eletricidade da Europa flui através deste país, com as vantagens proporcionadas por sua localização no centro da região e sua topografia.

No mapa energético europeu, os lagos de montanha da Suíça podem funcionar como uma enorme bateria para a energia renovável de geração inconstante, e produzir grandes ganhos. Suas represas proporcionam 57% da produção de eletricidade do país. Embora alguns destes lagos não sejam reservas naturais de água, servem como bacias para as usinas hidrelétricas de acúmulo por bombeamento.

O sistema é simples e por muito tempo tem sido um bom negócio. Ao longo do dia se compra eletricidade livre e barata no mercado, em seguida é usada para bombear água de uma reserva mais baixa para uma bacia que está no alto da montanha. Em momentos em que a demanda elétrica é alta, a água armazenada é liberada e movimenta as turbinas, produzindo eletricidade, que pode ser vendida no mercado a um preço maior. As instalações hidrelétricas de acúmulo por bombeamento funcionam como enormes baterias.

Na Suíça, funcionam atualmente 11 dessas usinas, com capacidade combinada de 1.400 megawatts (MW). Outros três projetos estão em construção a fim de aumentar a capacidade de armazenamento por bombeamento para 3.500 MW até 2017. E projeta-se criar outras duas: Grimsel 3, na Passagem de Grimsel, nos Alpes de Berna, e Lago Bianco, na Passagem de Bernina, em Grisons. “A simbiose entre natureza e tecnologia definiu o caráter desta paisagem”, descreve a agência de turismo da região de Grimsel.

Ernst Baumberger, encarregado de imprensa na empresa regional de energia KWO, elogiou a beleza do lugar, dizendo que além da abundância de precipitações, a formação de gelos e as rochas como bases, bem como a imensa diferença de altitude, tornam a região ideal para o uso hidrelétrico. A KWO colocou em funcionamento sua primeira usina em Grimsel há 80 anos. Nos últimos tempos, esta empresa obteve licença para implantar seu projeto de 1,2 bilhão de francos suíços (mais de US$ 1,283 bilhão) chamado KWOplus, que inclui a construção de uma segunda central hidrelétrica e de acúmulo por bombeamento, a Grimsel 3.

Essa usina terá capacidade de 660 MW, praticamente a mesma de uma usina nuclear média no país. O plano gera controvérsias, tanto políticas quanto econômicas. “A Suíça não precisa de nenhuma instalação hidrelétrica e de acúmulo por bombeamento adicional. Tampouco faltam baterias, nem há um problema de estabilidade da rede de eletricidade”, afirmou Jürg Buri, diretor gerente da Fundação Suíça para a Energia, acrescentando que nenhum outro país opera tantas estações elétricas flexíveis quanto a Suíça.

Várias organizações ambientais dizem que é principalmente eletricidade barata gerada em usinas a carvão e nucleares a que é usada para o bombeamento, e que, durante o processo, se perde cerca de um quarto da energia. Em todo caso, não há nada “verde” na hidreletricidade de acúmulo por bombeamento. Se esse tipo de central fosse atualmente abastecida com energia limpa, “o negócio não seria rentável”, observou Buri. “Os ganhos da corrente máxima não bastariam para cobrir o preço de compra e a perda de energia por bombeamento”, explicou.

Segundo a licença, a KWO está obrigada a administrar Grimsel 3 com tanta energia renovável quanto seja “econômica e tecnicamente possível”, mas não foi definida uma cota fixa. Baumberger ressaltou que, no longo prazo, as hidrelétricas de acúmulo por bombeamento da companhia deveriam funcionar unicamente com eletricidade verde. “Porém, o critério principal continuará sendo o da rentabilidade”, pontuou.

Enquanto a empresa energética elogia Grimsel 3 como uma importante contribuição à segurança energética, Buri entende que o negócio de acúmulo por bombeamento pressiona ainda mais as linhas de transmissão. “Na verdade, para operar Grimsel 3 será preciso construir mais linhas, algo que frequentemente as pessoas esquecem”, afirmou. Atualmente, a KWO está ocupada preparando a documentação para as autorizações de construção. No passo seguinte, o conselho diretor debaterá as perspectivas de rentabilidade e decidirá sobre os investimentos.

“No tocante a Grimsel 3, os acionistas são um pouco cautelosos”, disse o porta-voz da empresa. “Temem que, com os atuais preços da eletricidade, os investimentos não deem dividendos”. A Associação Suíça para o Manejo da Água vê como de risco os investimentos em hidrelétricas de acúmulo por bombeamento, e considera que sua rentabilidade é instável.

Na Bernische Kraftwerke, dona de metade das ações da KWO e que maneja o comércio de eletricidade, o encarregado de imprensa se negou a dar declarações sobre as perspectivas deste tipo de hidrelétricas. Não é nenhum segredo que as companhias de energia suíças estão profundamente preocupadas pela instabilidade dos preços da eletricidade e pela queda da diferença de preços entre a corrente das horas de pico e das horas de baixa. Essa diferença é essencial para o modelo empresarial das usinas hidrelétricas de acúmulo por bombeamento, que dependem de fornecer a cara corrente das horas de pico, especialmente ao meio-dia.

Atualmente, as energias eólica e solar subsidiadas de outros Estados europeus estão conquistando esse mercado, desafiando e aplainando os preços da corrente máxima e, portanto, reduzindo a proporção de ganhos de fornecedores de energia baseados na nova modalidade. Buri está seguro de que logo chegará ao fim o “impulso de bateria” da Suíça. “Não se construirá nem Lago Bianco nem Grimsel 3. Os riscos econômicos são muito altos”, advertiu.

Buri também ressaltou que os dois projetos têm como alvo principal o mercado europeu. “Não se deve esquecer que, além de reduzir os ganhos derivados do comércio de eletricidade, as centrais hidrelétricas suíças de acúmulo por bombeamento se veem ainda mais desafiadas pela quantidade cada vez maior de usinas elétricas flexíveis na Europa”, destacou.

Baumberger explicou que sua empresa tem opções diferentes para avançar com Grimsel 3. “Se piorar a situação do mercado elétrico, poderemos dividir a construção de Grimsel 3 em várias etapas. Em cada uma se poderá analisar os fatos do mercado antes de seguir adiante com a construção”, explicou.

Em contraste com as organizações ambientalistas, Baumberger se mostra otimista. À luz do auge da energia eólica e solar na Europa, a demanda por mais capacidade de armazenamento aumentará, afirmou. “O que a Suíça oferece até agora em termos de armazenamento de energia é ainda pouco mais do que uma gota no oceano”, acrescentou. Embora as opiniões sobre o futuro da hidreletricidade de acúmulo por bombeamento no país diferem muito, uma coisa parece certa: as perspectivas da indústria estão nas mãos de políticos e empresários europeus, não dos suíços. Envolverde/IPS