Carachi, Paquistão, 22/4/2013 – Quem ganhará as eleições de 11 de maio? É a pergunta que todos fazem no Paquistão, desde o açougueiro do bairro, passando pelo vendedor de frutas ambulante, até o sapateiro sentado com sua caixa de engraxate em uma agitada rua desta cidade portuária.
No entanto, neste país, afetado pela insurgência do movimento extremista Talibã no noroeste, pela incontrolável corrupção governamental e algumas forças armadas praticamente autônomas, poucos têm uma resposta. O certo, no momento, é que pela primeira vez na história os jovens entre 18 e 29 anos, que representam mais da metade dos 170 milhões de habitantes, terão um papel decisivo nas eleições.
Dos 85 milhões de eleitores aptos a votar, 25 milhões são jovens, e destes 13 milhões votarão pela primeira vez. Porém, um estudo realizado em janeiro pela Rede de Eleições Livres e Justas (Fafen), com sede em Islamabad, diz que apenas 48% das 4.450 pessoas entrevistadas com idades entre 18 e 25 anos disseram que vão votar.O número é muito baixo em relação aos 68% dos entrevistados na faixa etária de 26 a 35 anos e dos 84% entre maiores de 55 anos que expressaram sua intenção de votar.
É que muitos jovens, como a cineasta Abida Sharafa, estão fartos. “Não quero votar em gente que fique cinco anos no poder para nos oprimir e explorar”, disse à IPS em relação aos dirigentes políticos denunciados por morosidade e evasão fiscal. Mohammad Shafi, de 27 anos, quase analfabeto e que faz trabalhos domésticos em uma casa de um bairro rico de Carachi, afirmou que o governo do Partido do Povo do Paquistão (PPP) esvaziou seus “bolsos e aumentou a violência” nos últimos cinco anos.
Uma pesquisa do British Council (BC) sobre os jovens paquistaneses mostra que metade dos cinco mil consultados, entre 18 e 29 anos, disseram que a democracia, defendida a todo custo pelo centro-esquerdista PPP, não é uma boa forma de governo. Além disso, 64% dos homens entrevistados e 75% das mulheres disseram ser “conservadores” religiosos.
Shafi disse à IPS que “prefere um país onde vigore a shariá (lei islâmica)”, mas se apressou a explicar: “não a que o Talibã quis impor em Swat (distrito da província de Jiber Pajtunjwa), mas uma que promova a igualdade e a justiça”. Segundo Sharafa, os mandatos religiosos se “aproximam dos valores socialistas que defendo”. Por exemplo, o Zakat, um dos cinco preceitos fundamentais do Islã, estabelece a doação de uma porcentagem da riqueza pessoal como um “imposto” para o governo ou para os necessitados.
A prevalência dessa forma de pensar entre os jovens ficou confirmada pelo estudo do BC, cujas conclusões “não surpreendem”, segundo o analista em política e defesa Hasan Askari Rizvi, morador em Lahore. “O perfil conservador e islâmico dos jovens paquistaneses pode facilmente ser detectado em suas expressões e referências históricas”, disse à IPS. Como exemplo, afirmou que expressões como “Alá Hafiz “ (que Deus te proteja) substituíram outras de origem persa na fala cotidiana.
O médico Pervez Hudbhoy, conhecido ativista com mais de três décadas de experiência como professor, atribui essa tendência à islamização do sistema educacional paquistanês, imposto pelo ditador Mohammad Zia-ul-Haq na década de 1980. Os jovens se “esqueceram de como cantar, dançar ou atuar. O medo de que fundamentalistas violentos quebrem suas cabeças funcionou muito bem”, ressaltou.
Poucos de seus alunos na Universidade Quaid e Azam, de Islamabad, têm conhecimento profundo de um idioma e não leem muito mais do que os jornais. Os livros de texto atuais carecem de referências à história antiga, à civilização do vale do Nilo, à Grécia ou à mitologia hindu, acrescentou Hudbhoy.
As autoridades tentaram enfrentar os extremistas religiosos na educação, mas tiveram que voltar atrás. Quando há alguns meses o governo da província de Punjab encomendou um livro de texto em urdu para a décima série, a imprensa conservadora o criticou implacavelmente por ter “expurgado” os ensinamentos islâmicos.
Porém, Hudbhoy questionou que o primeiro capítulo do livro era um “hamd” (poema de louvação a Deus) e o segundo um “naat” (elogio ao profeta Maomé). Também continha cartas do famoso poeta Mirza Ghalib, que escrevia em urdu, e um conto. Contudo, após a intensa pressão de dirigentes direitistas, as autoridades “prometeram recolocar textos sobre a jihad (guerra santa) e o Islã”, informou Rizvi.
A educação islâmica inclinou os jovens para posturas favoráveis aos insurgentes e contra os Estados Unidos, acrescentou Rizvi. “Costumam se ver mais como muçulmanos do que como paquistaneses. A maioria considera que o Ocidente é responsável por seus problemas”, ressaltou.
Agora a vestimenta é um reflexo dos valores entre os jovens. Sharafa, que usa um vestido tradicional paquistanês, mas não cobre a cabeça, disse que “a quantidade de barbas longas e de batas negras aumentou enormemente” neste setor da população. “Agora me sinto parte da minoria”, acrescentou. Sua decisão de não cobrir a cabeça expressa “graficamente” seu pensamento liberal. “Costumo ter de explicar aos meus amigos que sou uma muçulmana tão praticante em minha vida privada como eles em público”, acrescentou.
Por sua vez, Mohammad Shehzad, escritor e pesquisador de Islamabad, questionou a objetividade do estudo do BC. “A pesquisa foi utilizada pelos islâmicos para apoiar sua revoltante reclamação de que a maioria das pessoas deseja a shariá”, afirmou à IPS. Envolverde/IPS