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Refugiados buscam chegar à Europa por qualquer caminho

Um jovem caminha perto do posto policial de Gundik Shalal, nordeste da Síria. A guerra nesse país aumentou o número de pessoas que buscam refúgio na Europa. Foto: Karlos Zurutuza/IPS
Um jovem caminha perto do posto policial de Gundik Shalal, nordeste da Síria. A guerra nesse país aumentou o número de pessoas que buscam refúgio na Europa. Foto: Karlos Zurutuza/IPS

 

Atenas, Grécia, 24/9/2013 – Enquanto a implacável guerra na Síria segue engrossando as filas dos refugiados que se dirigem à Europa, a Grécia se converte rapidamente em uma porta de entrada que é preferível evitar. A maioria dos sírios e outros que fogem de seus países tentam alcançar o norte da Europa por diferentes rotas. E os terríveis Bálcãs são uma dessas alternativas.

Com mais imigrantes do que pode manejar e uma prolongada crise econômica que aprofundou a xenofobia da população local, a Grécia decidiu endurecer o controle de suas fronteiras na primavera boreal deste ano. Além disso, alojou os imigrantes sem documentos em centros de detenção e nos últimos meses vieram à luz desrespeito aos direitos humanos, cometidos por policiais contra essas populações.

Para muitos, o território grego é o caminho menos seguro e uma viagem cheia de horrores, disse Hasam Nazari, músico afegão de 25 anos, que tentou por várias vezes chegar ao norte da Europa, após passar 18 meses na Grécia. Seu objetivo era chegar à Hungria e dali ir para a Áustria. Tentou por cinco vezes antes de ficar sem dinheiro e voltar para a Grécia.

“Vimos um bando violando um adolescente de 13 anos depois de cruzar a fronteira” com a ex-república iugoslava da Macedônia, contou Nazari à IPS. “Se não tem euro para dar, eles mutilam você”. Esperam do outro lado da fronteira, em uma região de casas abandonadas, caminho para o interior do território, “andam de bicicleta, em grupos de dez ou 12, e têm armas”, ressaltou.

Os saques são comuns. “Levam você para o mato, deixam você nu e roubam tudo o que tiver. E só não apanha por muita sorte”, detalhou Nazari. A polícia sabe disso. Certa vez “bateram em nós na frente dos policiais, e eles olharam para o outro lado. Estão mais preocupados em aplicar mão dura aos refugiados e imigrantes ilegais”, destacou.

A preferência pela rota dos Bálcãs começou a figurar nas estatísticas desde o começo do ano, segundo Izabella Cooper, porta-voz da Frontex, a agência da União Europeia para a segurança das fronteiras externas. “A rota dos Bálcãs ocidentais teve um aumento de trânsito de 300% desde o começo do ano”, disse à IPS. A Bulgária é o país com maior crescimento: o número de pessoas que chegam da Síria, Argélia, Iraque e Paquistão aumentou seis vezes, acrescentou.

“Entre 60 e 70 pessoas, às vezes até cem, cruzam diariamente a fronteira”, desde o começo do ano, informou Cooper. “Vemos uma mudança para o leste”, reconheceu Boris Cheshirkov, da unidade de informação pública no escritório do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (Acnur) na Bulgária. “Agora, os grupos maiores atravessam as densas florestas das montanhas de Strandzha (rumo ao limite sudeste da Bulgária com a Turquia). É um terreno extremamente difícil, com pouquíssima visibilidade”, ressaltou.

Os contrabandistas já se adaptaram a estas novas rotas e começaram a pedir mais dinheiro aos imigrantes desesperados para levá-los à fronteira. Antes cobravam 500 euros (US$ 677) por pessoa para um traslado aos limites entre Turquia e Grécia, ao longo do rio Evros, e agora querem quase 3.500 euros (US$ 4.736). Apesar do que cobram, “os contrabandistas levam os grupos apenas até próximo da fronteira, não cruzam com eles nem os guiam”, explicou Cheshirkov.

Cheshirkov citou como exemplo Uaheyda Nur, uma refugiada síria que agora cumpre pena de prisão em Silven, cidade búlgara a 130 quilômetros da fronteira com Grécia e Turquia. Essa mulher de 35 anos, mãe de quatro filhos, “chegou à Bulgária com seu marido, Abdul Hanan Nur, de 38 anos, em dezembro de 2012”, contou à IPS. A família recebeu alojamento no centro de refugiados da localidade fronteiriça de Pastrogor.

Porém, em janeiro Nur tentou partir para a Sérvia com uma filha e um filho. Foi detida pela polícia de fronteira, condenada a oito meses de prisão e está em Silven desde fevereiro. “Sua libertação estava prevista para agosto, mas até agora não aconteceu”, disse Cheshirkov, acrescentando que “há 30 solicitantes de asilo na Prisão Central de Sofia”.

Cerca de dois mil imigrantes ilegais chegaram ao país em 2010, no ano seguinte foram 9.500, e em 2012 o número foi de 15 mil, segundo o Centro Sérvio para as Migrações, criado pela organização não governamental Grupa 484. Estima-se que outros 20 mil entrarão neste ano no país. Entretanto, Nenad Banovic, chefe da polícia fronteiriça da Sérvia, disse que “vimos uma pequena redução das chegadas nos primeiros seis meses de 2013”. Ela atribui à abertura da rota Turquia-Bulgária-Romênia, bem como à de Grécia-Macedônia-Kosovo-Montenegro-Bósnia Herzegovina-Croácia.

No entanto, como ocorre na Grécia, a pressão dos imigrantes supera a capacidade das instalações dedicadas ao asilo na Bulgária e na Sérvia. Os três centros de refugiados da Bulgária – um em Sofia e dois mais perto da fronteira turca, em Banya e Pastrogor – operam acima de sua capacidade, com 1.l70 pessoas. Há duas semanas, o governo búlgaro destinou o equivalente a US$ 340 mil para custear alojamento para outras 500 pessoas.

O sistema sérvio também tenta enfrentar o fluxo de refugiados. “Nos esforçamos para mantê-los”, declarou Banovic, da polícia de fronteira da Sérvia, mas o país “tem recursos limitados e nenhuma ajuda da Europa”. As dificuldades não desanimam os imigrantes de se dirigirem para a cidade fronteiriça de Subotica, 184 quilômetros ao norte de Belgrado, pontuou Nazari.

Muitas famílias residem em uma velha fábrica de tijolos na cidade. Outras permanecem na floresta que fica junto à cidade até poderem testar a sorte na fronteira húngara, poucos quilômetros para o norte. A maioria é pega quando tenta cruzar, e é mandada de regresso. “A maior parte destes retornos não é oficial, mas, para cada tanto, alguns são formalmente devolvidos”, afirmou Miroslava Jelacic, analista legal no Grupa 484. Porém, os que conseguem cruzar são um incentivo para que outros voltem a tentá-lo, uma e outra vez. Envolverde/IPS